002: PEDRA E MONSTRO
luckas iohanathan | 850+ assinantes | hq mix | a semana | capitalismo | alan moore | páginas viradas
[COMO PEDRA, Luckas Iohanathan, página 52 a 54, Comix Zone.]
Li em um grupo de discussão de quadrinhos:
“Luckas Iohanathan lançando suas primeiras HQs. Será que o garoto começou bem?” Era a mensagem antes de uma foto de Iohanathan e os nomes de seus dois lançamentos: O MONSTRO DEBAIXO DA MINHA CAMA, pela editora Pipoca & Nanquim, e COMO PEDRA, pela editora Comix Zone.
Pipoca & Nanquim e Comix Zone são duas editoras de respeito entre os leitores. O mesmo sujeito lançar pelas duas, ao mesmo tempo, é como o sujeito estrear na Marvel e na DC ao mesmo tempo. Em proporções de quadrinho brasileiro.
O único problema é que não foi agora que ele estreou nem que “começou bem”.
“Acho que essa coincidência de ter duas obras, com cinco anos de diferença, sendo publicadas no mesmo mês faz parecer que realmente surgi ‘do nada’”, Iohanathan me contou em conversa pelo Instagram.
O MONSTRO DEBAIXO DA MINHA CAMA foi produzida em 2018 e, apesar de Iohanathan ter procurado editoras, acabou lançando-a no digital, por conta própria, em 2020. Lançou mais quadrinhos depois, sempre no digital: 30 SEGUNDOS e meu preferido, ENTERREI TODOS NO MEU QUINTAL. A primeira que vai sair direto no papel, inédita, é COMO PEDRA.
Ele também já está perdendo o direito de ser chamado de “garoto”. Faz 29 anos este mês. Quadrinhos são paixão desde que ele era garoto mesmo, quando começou a desenhar e não parou mais. Mas, por enquanto, ele paga as contas como diretor de arte e ilustrador frila.
O MONSTRO DEBAIXO DA MINHA CAMA, Luckas Iohanathan, páginas 49 e 50, Pipoca & Nanquim
O MONSTRO DEBAIXO DA MINHA CAMA trata de Lucy, menina que cria um mundo de fantasia para aguentar os abusos do pai e a omissão da mãe.
“Surgiu da curiosidade sobre o impacto mental nas crianças que lidam com situações traumáticas, causadas pelos adultos em um mundo onde elas não pediram para participar, mas são as que mais sofrem”, diz Iohanathan. “E como cresci lendo gibi de super-herói, decidi juntar as duas coisas.”
COMO PEDRA acompanha uma família no sertão nordestino depois de 300 dias sem chuva, com uma filha com deficiência e o filho envolvido em uma seita religiosa que promete a salvação.
“Foi mais um interesse por histórias trágicas, onde os personagens são colocados em situações complicadas e precisam lidar com escolhas difíceis”, diz Iohanathan. “Ambientar esse tipo de história no sertão nordestino fazia todo sentido pra mim, pois eu poderia abordar outros temas e camadas.”
Li COMO PEDRA e falei que era o “Itamar Vieira Junior dos quadrinhos”. Não só porque o autor de Torto arado é do nordeste (ele é baiano, Ionathan é potiguar) e conta histórias do nordeste. Tem alguma coisa no jeito como os dois entram na cabeça dos personagens e encontram exemplos de resistência. Pode ser um reflexo do sertão. Pode ser por que eu vi algo em comum entre a arte de Iohanathan e as capas de Aline Bispo nos livros do Itamar Vieira Junior.
Aliás, capa linda, essa de COMO PEDRA.
Seja como for, Ionathan não leu TORTO ARADO nem os outros livros do baiano. “Não conhecia, mas agora fiquei curioso. Espero que a comparação seja um elogio, hehe”. É.
Bastien Vivès, por outro lado, ele conhece e diz que é uma grande influência. POLINA, UMA IRMÃ, O GOSTO DO CLORO e outros dos trabalhos sérios do francês “me passam uma sensação nostálgica, melancólica, sei lá. Que é algo que tento nos meus trabalhos, principalmente ENTERREI TODOS NO MEU QUINTAL.”
“Uma vez eu vi um vídeo do Vivès desenhando sem rascunho, apenas desenhando e corrigindo as linhas. Isso acabou me ajudando bastante porque nunca gostei de desenhos muito mecânicos, traços perfeitos. Quando vi a arte dele, me deu confiança de desenhar com linhas, digamos, imperfeitas. Algo que eu queria desde o meu primeiro quadrinho, mas não me sentia seguro para isso. Mas claro que a cada trabalho eu tô tentando desenvolver meu próprio estilo.”
Ele diz que lê tudo de Marcello Quintanilha, Dan Clowes, Manuele Fior, Adrian Tomine. Lê filosofia ou literatura que cai na filosofia: Albert Camus, Tolstoi, Iain Reid. Ouve Beach House, Agnes Obel, Radiohead, Gram e tenta passar para as páginas de HQ. E diz que ficou um tempo sem desenhar, recentemente, devido ao vício em Elden Ring.
Iohanathan mudou-se da sua cidade natal, Mossoró, para Rosário, na Argentina, há dois anos. No meio dos quadrinhos, a cidade é conhecida por um festival anual, o CRACK BANG BOOM. O autor diz que foi ao festival pela primeira vez este ano “para conhecer o Quintanilha”. Mas que não interage tanto com a cena dos quadrinhos; é muito caseiro.
Por morar longe dos eventos e não estar nos grupos e redes de papo sobre quadrinhos, aumenta a impressão de que ele surgiu do nada.
O MONSTRO DEBAIXO DA MINHA CAMA ganhou a publicação pela Pipoca & Nanquim quando foi selecionada no Prêmio Geek de Literatura. COMO PEDRA foi finalista do Prêmio Latino-Americano de Quadrinhos, colaboração entre editoras argentinas, francesa e brasileira; mesmo que não tenha sido o selecionado, a Comix Zone resolveu publicar.
PEDRA tem lançamento previsto para 29 de setembro (segundo a data da amazon). O MONSTRO, para o dia seguinte (também segundo a mazon). As duas editoras me disseram que é coincidência.
“Para as pessoas, a diferença de tempo dessas duas obras pode ser de dias”, ele conta. (Ou um dia.) “Mas pra mim, já que faço quadrinhos desde criança, parece uma vida inteira.”
Outros quadrinhos de Luckas Iohanathan:
30 SEGUNDOS (gumroad)
ENTERREI TODOS NO MEU QUINTAL (kindle)
A primeira VIRAPÁGINA foi para 150 e poucos guerreiros que nem sabiam o que era uma VIRAPÁGINA.
A segunda VIRAPÁGINA vai para 850.
Cinco assinantes comprometeram-se a pagar para receber a newsletter, mesmo que eu ainda não tenha autorizado cobrança. Antes de eu ativar as cobranças – que serão só para quem quiser pagar, fique claro – quero descobrir se consigo manter a periodicidade disso aqui.
Muito obrigado pelo voto de confiança. De todos.
No momento, estou perdendo a BIENAL DOS QUADRINHOS DE CURITIBA, onde está todo mundo que importa no quadrinho nacional. Participei de todas as edições do evento, desde 2011. Fui curador da edição de 2018. Este ano não deu. Se você está em Curitiba, aproveite por mim e não esqueça de dar parabéns e obrigado à homenageada do ano, Lilian Mitsunaga.
Ah, uma meio-correção da newsletter anterior: O COMBATE COTIDIANO devia ter saído em agosto, mas atrasou um pouquinho. Sai na semana que vem.
Meus votos no 35o HQ MIX, a quem interessar possa.
A votação vai até dia 12. A divulgação dos premiados acontece em novembro, e a cerimônia de premiação será em 6 de dezembro. Todos os indicados.
Web Tira: CARTUMANTE
Web Quadrinhos: LUTO É UM LUGAR QUE NÃO SE VÊ, Gabriela Güllich
Publicação Independente Seriada: COMO FAZER AMIGOS E ENFRENTAR FEITICEIROS, Eric Peleias e Gustavo Borges
Publicação Independente Ed. Única: E O MAR ME TROUXE ATÉ AQUI, Phellip Willian e Eduardo Ribas
Publicação Independente De Grupo: HARVI #01
Publicação Mix: BAILE DE MÁSCARAS
Edição Especial Estrangeira: O LUGAR ERRADO, Brecht Evens
Edição Especial Nacional: EM BUSCA DO TINTIN PERDIDO, Ricardo Leite
Publicação De Aventura/Terror/Fantasia: EM FUGA, Lelis
Adaptação Para Os Quadrinhos: BARRELA, João Pinheiro
Publicação De Clássico: LITTLE NEMO VOL. 1: 1905 –1909
Publicação Infantil: COMO FAZER AMIGOS E ENFRENTAR FEITICEIROS, Eric Peleias e Gustavo Borges
Publicação Juvenil: CALMARIA, Phellip Willian e Melissa Garabeli
Publicação De Humor: LINHA DO TREM: É O QUE TEM PRA HOJE, Raphael Salimena
Livro Teórico: HQ: UMA PEQUENA HISTÓRIA DOS QUADRINHOS PARA USO DAS NOVAS GERAÇÕES, Rogério de Campos
Publicação Em Minissérie: PING PONG, Taiyo Matsumoto
Publicação De Tira: LINHA DO TREM: É O QUE TEM PRA HOJE, Raphael Salimena
Mangá E Produções Correlatas: NAUSICAÄ DO VALE DO VENTO, Hayao Miyazaki
Editora Do Ano: Eu queria votar na Nemo, mas sei lá por que ela não concorre
Novo Talento Desenhista: Diox (O FIM DA NOITE)
Novo Talento Roteirista: Helô D´Angelo (NOS OLHOS DE QUEM VÊ)
Desenhista Nacional: Lelis (EM FUGA)
Roteirista Nacional: Rafael Calça (O FIM DA NOITE)
Colorista Nacional: Mariane Gusmão (O MENINO REI)
Arte Finalista Nacional: Marcelo D´Salete (MUKANDA TIODORA)
Evento: 11ª Edição do Festival Internacional de Quadrinhos de Belo Horizonte – FIQ BH 2022
Exposição: CATÁLOGO HQ BRASIL – Programa Brasil em Quadrinhos
Semana de pouco trabalho, o que geralmente é preocupante. Pouco trabalho me desestimula a trabalhar no pouco trabalho que eu tenho. O inverso também é válido.
Tem trabalhos por vir, que dependem de outras pessoas se mexerem. A conta da semana que vem vai chegar na próxima.
Traduzi mais 89 páginas de CHRISTIE10.
Surgiram mais umas páginas para traduzir, poucas, de um projeto ligado a MÁQUINA DO CAOS (Max Fisher, Todavia), livro que eu traduzi no ano passado. Já fiz a primeira versão de todas e vou revisar na semana que vem.
E umas pagininhas para fechar um Omnibus.
Primeira semana em muito tempo que não traduzo um quadrinho. De novo: tem material agendado, parei só devido a forças além do meu controle.
Gravei um episódio de NOTAS DOS TRADUTORES com os comparsas (sai no domingo) e saiu uma entrevista que dei a algum tempo a Chico Castro Jr., do jornal A TARDE, sobre Paco Roca:
Chris Ware diz que quadrinhos são uma arte da memória. Nunca entendi direito esta afirmação – por que outras artes não seriam da memória – mas ele elabora em entrevistas e textos. Tem a ver com as imagens serem estáticas e repetitivas, com pequenas mudanças (de quadro a quadro), e nossas memórias (e sonhos) também serem imagens estáticas da qual tiramos uma história, um sentido. Ou seja: não lembramos em cineminha nem em fotinhos, lembramos em quadrinhos. Talvez Roca, tal como Ware, tenha encontrado essa verdade maior sobre os quadrinhos e conseguiu colocar no papel.
Dá para ler aqui: “O fio da memória”.
E escrevi esta newsletter. E fiz toques em um projeto que estou empurrando com a barriga. E comecei uma colaboração meio inesperada com um amigo. Falo mais em outra edição.
em setembro
UM CORPO NA BANHEIRA, Dorothy L. Sayers, harpercollins (que já está circulando entre quem foi e vai à Bienal do Livro do RJ)
VAMPIRO AMERICANO, ED. DE LUXO VOL. 4, Scott Snyder e Rafael Albuquerque, panini
LÚCIFER: ED. DE LUXO VOL. 2, Mike Carey, Peter Gross, Dean Ormstron, panini
em outubro
ANIQUILAÇÃO: A CONQUISTA (OMNIBUS), Dan Abnett, Andy Lanning e grande elenco, panini [traduzi só os extras]
SETOR UM, Colson Whitehead, harpercollins
CONTOS DOS SUBÚRBIOS DISTANTES, Shaun Tan, darkside
em novembro
A BRIGADA DOS ENCAPOTADOS, K.W. Jeter, John K. Snyder III, Dave Louapre, Dan Sweetman, Alisa Kwitney, Guy Davis, John Ney Rieber, John Ridgway, panini
vem aí
NUNCA ME ESQUEÇAS, Alix Garin, moby dick [já existe, quem apoiou no catarse está recebendo; mas ainda não está à venda pra todo mundo]
NOVEMBRO VOL. 3 e 4, Matt Fraction e Elsa Charretier, risco
VOLEUSE, Lucie Bryon, risco
MONICA, Daniel Clowes, nemo
HOW TO e WHAT IF 2, Randall Munroe, companhia das letras
EVERYTHING IS FINE VOL. 1, Mike Birchall, suma de letras
CHEW VOL. 4, John Layman e Rob Guillory, devir
KRAZY & IGNATZ VOL. 2: 1919-1921, George Herriman, skript
COMIC BOOKS INCORPORATED, Shawna Kidman
mais BONE de Jeff Smith (e amigos), todavia
+ Adrian Tomine
+ Tom Scioli
+ Tom Gauld
+ Ray Bradbury
+ Shaun Tan
Todas as minhas traduções: ericoassis.com.br
Recauchutei um texto que escrevi há uns anos, “Alan Moore é mesmo tudo isso?”, para este livro, ALAN MOORE E A HISTÓRIA. Foi um convite dos editores. Sim, o barbudão é tudo isso, e eu tento explicar alguns fios daquela barba.
De brinde, também recauchutei/atualizei para o livro a “Bibliografia Alan Moore”, uma lista de todas as publicações daquele senhor com todas suas edições (e tradutores!) no Brasil. Esta bibliografia já tinha saído em MAGO DAS PALAVRAS, a biografia de Moore por Lance Parkin que traduzi em 2016 e que esgotou.
Aliás, Moore e sua barba completam 70 anos em novembro.
ALAN MOORE E A HISTÓRIA, organização de Artur R. I. Lopes Filho, Mario Marcello Neto e Felipe Radünz Krüger, Dokan Editora [kindle] - parece que também vai rolar uma pequena tiragem impressa.
Página dupla de LES PIZZLYS, Jérémie Moreau.
Stan, Jack e Steve em MARVEL AGE n. 1000: J. Michael Straczynski (roteiro), Kaare Andrews (arte), Joe Caramagna (letras).
Alanmoorizando em FANTASTIC FOUR n. 10: Ryan North (roteiro), Leandro Fernandez (desenhos), Jesus Aburtov (cores), Joe Caramagna (letras).
COMO PEDRA, Luckas Iohanathan, p. 83
Oitocentos e cinquenta e tantos obrigados. Se você quiser recomendar a newsletter, o endereço é virapagina.substack.com.
Vire páginas.
Eu acho engraçado você falar que o primeiro virapágina foi enviado para pessoas que nem sabiam o que era o virapágina. Estava escrito: substack do Érico Assis. Isso já é descrição suficiente.
Também consegui ler Como Pedra com antecedência e, apesar de não ter surgido agora, o Luckas ainda vai perdurar nesse mercado. Que quadrinho fantástico! Espero que o pessoal compre ambos impressos, mas também vão atrás do digitais, um talento desse merece ser muito conhecido e divulgado